Fileiras e mais fileiras de computadores são torturados incansavelmente nos laboratórios da Intel em Hillsborgo, no Oregon, para testar o novo microprocessador da companhia.
Mas em recente visita aos laboratórios, John Barton, o vice-presidente de teste de produtos da empresa, reconheceu que ainda assim se sentia ansioso quanto à possibilidade de que um defeito potencialmente fatal seja descoberto no último minuto.
Afinal, até mesmo o mais ínfimo erro em um chip pode se tornar um fracasso com custos bilionários.
“Ainda não estou dormindo bem”, disse Barton.
O microprocessador core i7 da Intel, conhecido pelo codinome Nehalem, será colocado à venda na segunda-feira e tem recebido resenhas técnicas entusiásticas. Mas é impossível para Barton prever exatamente como o chip vai funcionar em milhares de computadores, que operarão dezenas de milhares de programas.
O projeto e teste de um chip microprocessador avançado está entre as mais complexas atividades humanas. Para garantir que seus produtos apresentem o menor número possível de erros, a Intel gasta meio bilhão de dólares ao ano, em suas fábricas em todo o mundo, para testar os chips que fabrica por mais de um ano, antes de colocá-los no mercado.
Existem bons motivos para essa cautela. Em 1994, a gigante dos chips terminou humilhada por um pequeno erro na unidade de cálculo decimal de seus chips Pentium. O defeito, que resultou em uma embaraçosa ordem de recolhimento de chips, gerou uma virada violenta na cultura da companhia, que havia adotado requerimentos mínimos de teste para o Pentium.
Uma série de defeitos no microprocessador Barcelona, lançado no ano passado pela AMD, a principal concorrente da Intel, se provou igualmente devastadora.
A AMD vinha apresentando um progresso consistente, e estava oferecendo novas tecnologias de processamento sempre antes da Intel, bem como vencendo com facilidade a batalha da eficiência energética. Mas os problemas de controle de qualidade que varreram a empresa causaram forte queda de receita que já dura alguns trimestres e a colocaram em uma crise da qual ainda não conseguiu sair.
Caso o Nehalem seja um sucesso para a Intel, ele representará uma vitória para Andrew Grove, o antigo presidente-executivo da companhia, que reconheceu ter sido apanhado de surpresa pelos defeitos do Pentium e decidiu reformar a empresa.
Os defeitos do Pentium prejudicaram seriamente a marca da Intel junto aos consumidores. A empresa se tornou alvo de piadas que não demoravam a se espalhar pela Internet, por exemplo: “Sabe como os republicanos conseguem cortar impostos e reduzir o déficit nacional ao mesmo tempo? Usam planilhas acionadas por um computador Pentium”.
Depois de inicialmente tentar refutar as críticas, a Intel mudou de curso e anunciou desculpas formais pelos problemas e a constituição de um fundo de US$ 420 milhões para custear o recolhimento dos chips defeituosos.
A empresa distribuiu chaveiros aos seus clientes contendo um pronunciamento de Grove sobre a questão que se tornou famoso: “Más empresas são destruídas por uma crise. Boas empresas sobrevivem a ela. Grandes empresas melhoram quando elas acontecem”.
São palavras que pesam sobre os ombros de Barton e seus colegas – da mesma forma que a pressão dos clientes da Intel em todo o mundo cuja sobrevivência depende de sua capacidade de criar produtos novos acionados pelos chips da companhia. O Nehalem está dirigido inicialmente a computadores de mesa, mas a companhia espera que mais tarde ele venha a ser usado em diversos outros equipamentos, como servidores e laptops.
“Nosso modelo de negócios depende agora de podermos afirmar aos clientes que eles terão uma nova funcionalidade disponível a partir de determinada data”, disse Barton. “Estamos sofrendo pressão de um novo tipo, no sentido de que não podemos mais demorar o quanto quisermos para apresentar um produto”.
A pressão por produtos bem sucedidos é especialmente intensa nos momentos de crise do setor de tecnologia. O presidente-executivo da Intel, Paul Otellini, disse no mês passado que a empresa estava encontrando “respostas contraditórias” de seus clientes quanto a futuros gastos. As ações da Intel caíram em 7,7% na sexta-feira, para US$ 13,32, sua mais baixa cotação em seis anos, acompanhando a queda mais ampla das bolsas.
Com o Nehalem, os projetistas da Intel tomaram a geração anterior de chips da empresa e acrescentaram diversos novos recursos, cada um dos quais eleva a complexidade e desperta a possibilidade de interações imprevisíveis.
“Agora estamos chegando à complexidade sistêmica”, disse Aart de Geus, presidente-executivo da Synopsys, uma empresa que desenvolve software de programação de chips. “Coisas que vinham de diferentes ângulos e costumavam ser independentes no passado hoje se tornaram interdependentes”.
Tentar definir a complexidade do que Barton e sua equipe enfrentam é um desafio por si só. Por exemplo, no final dos anos 70, os chips que estavam sendo projetados envolviam diagramas tão complicados quanto o mapa das ruas de uma grande cidade.
Mas o avanço do Intel 8088, que acionou o primeiro IBM PC há 27 anos, para o Nehalem é um salto de um total de 29 mil para 731 milhões de transistores, em um chip mais ou menos do mesmo tamanho.
Barton compara os dois mencionando à cidade de Ithaca, em Nova York, ao continente europeu. “Ithaca é uma cidade complexa, se você pensar em tudo que acontece por lá”, diz. “Mas aumente sua população para 730 milhões de habitantes, mais ou menos a da Europa. E depois tente encaixar todos esses habitantes em um território igual do Ithaca”.
Tradução: Paulo Migliacci ME
The New York Times
Fonte*: Terra Tecnologia